quarta-feira, 9 de abril de 2008

UM CARMENERE GOSTOSO MAS PRA LÁ DE CARO

Ontem, num jantar comemorando aniversário de família, estive no restaurante Chalet Suisse, tradicional restaurante franco-suíço localizado próximo ao nosso famigerado bairro gastronômico de Santa Felicidade. Não há muito o que se falar sobre o restaurante para quem o conhece, pois a solidez e a tradição de uma cozinha correta e primorosa são uma garantia de que se coma bem. É gostoso reconhecer que a experiência do chef Arthur e o tempo de estabelecimento traz a sensação de que qualquer coisa que se peça do cardápio estará saborosa ao chegar à mesa. Obviamente, é um perfil específico: o cardápio não sofre de experimentalismos excitantes e não há nouvelle cuisine ou fusion cuisine ali. Mas se você pedir um mignon ao molho bearnaise (como eu fiz), terá um clássico molho bearnaise na densidade certinha e equilibrado em temperos, sobre um mignon bem alto e no ponto exato pedido. Mas, panelas à parte, vamos falar de vinho. Pesquisando a carta de vinhos para ter à mesa algo que acompanhasse mignons e pato (os pedidos de quem ia bebericar um tinto), acreditei que a melhor escolha dentro da faixa de preço que queríamos enfrentar era um chileno da vinícola Santa Ema, de algum modo cantada em lojas e por enófilos no momento como uma casa cuidadosa em todas as categorias de vinho que produz. O vinho, "barrel select 2004" identificado pela vinícola como um "reserva", mostrou madeira sutil, taninos bem equilibrados, nada rascante (característica que não vi ainda na Carmenére), mas acho que diante de um pato com laranjas que provei ou do meu mignon au sauce bearnaise não "aguentou" a parada. Na prova inicial, antes de servir, o vinho estava um pouco fechado ainda, mas já exibia fruta em compota e um pouco de especiarias, fractais de cravo e de pimenta negra. Obviamente, não fiquei falando nada disso na mesa, apesar de estar ali com as pessoas mais íntimas do planeta pra mim. Já vi filmes e diversas satirizações dessas situações. Tenha certeza, só se leva a sério exame visual, olfativo e do palato nas rodinhas de interessados. Mas pra ser sincero, quando estive frequentando um evento desses, o que se via era uma disputa pra ver quem achava mais coisas no nariz e na língua. Era engraçado e revelador... um cabo-de-guerra vaidoso em alguns momentos. Um dia vou contar aqui a primeira vez que senti cheiro de algo num vinho que não era cheiro de vinho... mas isso rende muito balbuciar, ô. No fim, o que quero dizer é que o Brasil prossegue sendo prodigioso em sobretaxar as coisas de fora. E os restaurantes continuam sendo proibitivos em termos de preços. O vinho que tomamos não chega a custar USD 8,00 lá fora (em preços de hoje, menos de R$ 15,00). Considerando a isenção fiscal que o Chile dá para que se exporte, se pode afirmar que o vinho deva chegar ao Brasil pelo menos com 20% a menos (desculpem o achismo, me corrijam se estiver errado). Isto significa o preço de entrada aqui por algo em torno de R$ 12,00. Imaginemos que o importador pague 80% entre impostos e frete, e assim tenha o custo do vinho a R$ 21,60. Por fim, que lucre 40%, o que dá ao restaurante preço de compra de R$ 30,24. (ninguém pode afirmar que não dá pra comprar direto das importadores hoje... só por curiosidade perdi 5 minutos, liguei para a importadora do Santa Ema enquanto digitava este texto, e recebi a informação de que o restaurante pode comprar esse vinho a R$ 32,00 e ainda receber desconto, o que faz com que minhas conjecturas anteriores sejam muito próximas de me fazer bidu). Mas, como a utilidade pública desta postagem recai sobre o preço do restaurante, e se alguém estiver lendo estará curioso mesmo quanto aos cifrões finais (o que pagamos, e ainda com cara de felizes), testemunho para os curiosos que o restaurante obteve nada mais nada menos do que 62,5% (sessenta e dois e meio porcento! com direito à ponto de exclamação), de lucro. (pagamos R$ 52,00 no vinho). Informações espargidas, utilizem-nas como quiserem, mas longe de condenar catolicamente o lucro como na idade média, concordo com um conhecido articulista de vinho nacional, que afirmou que não se sabe se a gente continua bebendo pouco em restaurantes porque "o preço é estúpido, ou é o preço, estúpido".

4 comentários:

Anônimo disse...

Caro Elmo,

Agradeço seus comentários positivos do restaurante e espero que continue nos prestigiando, assim como prestigiarei seu blog. Quanto ao preço do vinho, é praxe nos restaurantes da nossa categoria uma margem bruta de 80% em cima do preço de custo. Mas não se esqueça que também pagamos impostos e diversas despesas para mantermos um negócio aberto neste país.
Um abrazo, Arthur Saredi
Restaurante Chalet Suisse

Urano disse...

... acabo de chegar de mais uma de muitas viagens ao Império! não canso de criticar muitos aspectos ruins da cultura e da sociedade americana mas não canso, igualmente, de admirar a capacidade de produzir e multiplicar riqueza, fazendo-a, concomitantemente, resultar em vida melhor para os cidadãos. Afirmo peremptoriamente que uma das grandes razões do sucesso daquela sociedade é ter assimilado que margens razoáveis (de lucro, de tributação, etc) estão sempre na casa de um dígito, e frequentemente ao ano! Conheço as dificuldades de se manter aberta uma empresa - em terras tupiniquins (na qual nosso querido governo considera tributação de 40% razoável)- mas, perdoe-me caro Arthur, colocar 80% de margem sobre uma garrafa de vinho não nos ajuda naquele sonho de pensar um Brasil melhor!

Urano disse...

... há, ia me esquecendo, de contar que esta semana tomei (uma taça por dia)um correto Luigi Bosca Reserva Malbec 2004 comprado na Casa China a USD 9,20. Satisfação garantida!

Colheita de Vinhos disse...

Olá Elmo,

Obrigado pela sua visita em meu blog, na realidade "minhas anotações" ...

Não costumo tomar vinhos em restaurante, sinceramente não tenho coragem. Mas não deixo de tomar de 1 a 2 vezes na semana com minha esposa em um jantar em casa ...

Grande abraço,

Guilherme